Essa semana fui tomada por um desejo nostálgico de reencontrar um pedaço da minha história: o Sítio São João, construído pelo meu avô, seus irmãos e meu bisavô, em uma região próxima ao Porto do Pecém. Saí em busca desse lugar carregado de memórias, mas não o encontrei. Ainda assim, algo em mim insiste em continuar essa busca. Sinto que não é por acaso.
Penso que passar em um concurso público justamente nessa cidade, onde vivi grande parte da minha infância e onde meu avô paterno nasceu, carrega um significado maior. É como se a vida me trouxesse de volta para fechar ciclos e me reconectar com minhas raízes.
Enquanto dirigia pelas estradas que me levavam àquele sítio, percebi algo curioso: esse era o mesmo percurso que eu fazia quando criança, um caminho que me trazia medo e dor. Era a estrada que levava até o local onde eu fui abusada, um trauma que carreguei por muitos anos em silêncio.
Agora, 30 anos depois, percorro o mesmo caminho com um olhar diferente. O que antes me aterrorizava, hoje me faz admirar o verde das paisagens, sentir a brisa e reconhecer a força que construí ao longo dessa jornada. Percebo que não sou mais a mesma menina amedrontada.
E há uma ironia – ou talvez um destino – nesse percurso. Hoje, meu trabalho é justamente proteger e acolher crianças que passaram pelo mesmo que eu passei. Não fui eu que escolhi esse caminho, ele me escolheu. E essa missão, de ser uma voz para quem ainda não pode falar, de cuidar dos que foram feridos, me faz entender que, de alguma forma, a dor que carreguei se transformou em propósito.
Talvez encontrar o Sítio São João seja mais simbólico do que real. Talvez essa busca seja sobre me encontrar. Sobre reconhecer a menina que eu fui, a mulher que me tornei, e tudo que ainda posso ser.
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